Por Hyberville Neto – consultor e diretor da HN AGRO
Se você entrou na pecuária antes de 2019, essa não é a sua primeira fase de baixa, e se vai continuar nela, não será a última.
Sabendo disso, a estratégia é avaliar a sua realidade e lembrar que o mercado retomará a firmeza em um futuro não muito distante. O momento exato ninguém sabe, mas as oscilações de preços são acompanhadas de movimentos, como os abates de fêmeas, que nos ajudam a traçar expectativas e estratégias.
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Na última semana o IBGE divulgou os dados oficiais de abates de bovinos em 2022, confirmando o aumento da oferta já demonstrado pelo mercado pressionado e pelos números disponíveis até setembro.
No total de 2022 foram abatidas 29,8 milhões de cabeças, o que representa um aumento de 7,5% na comparação com o ano anterior, quando os abates somaram 27,7 milhões. Apesar do aumento anual, ainda foi o segundo menor abate desde 2016, maior apenas que o de 2021.
A figura 1 apresenta as variações por categoria, entre 2020/2021 e entre 2021/2022.
Com a queda do preço do bezerro ao longo de 2022, o resultado da cria piorou e houve desinvestimento, que passa pelo abate de vacas e novilhas. A participação de fêmeas no total abatido em 2022 foi de 37,3%, maior que em 2021 (33,7%). O pico de participação de fêmeas do último ciclo foi em 2018, com 41,6% do total abatido.
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Segundo a ASBIA (Associação Brasileira de Inseminação Artificial), as vendas de sêmen de raças de corte caíram 9,3% em 2022, na comparação com 2021, com redução de 26,0% para 23,5% das matrizes de corte inseminadas.
Cabe uma ponderação de que as 18,0 milhões de doses comercializadas em 2022 ainda são mais que o dobro das 8,1 milhões de 2017, ou seja, a tendência clara é de aumento do uso da tecnologia, apesar do movimento observado no último ano. Esse recuo, no entanto, ajuda a demonstrar o efeito do mercado sobre os investimentos nos diversos sistemas de produção.
Em algum momento, o abate de fêmeas crescente e o menor investimento na atividade impactarão a oferta de bezerros, resultando em valorizações. Isso aumenta a atratividade da cria e “estanca” a oferta de vacas e novilhas.
Em outras palavras, não é preciso que a safra mais enxuta de bezerros “ere” e chegue à idade de abate para afetar o mercado de animais terminados. Uma safra mais tímida de bezerros, valorizando a categoria, já diminui a oferta de carne pelo direcionamento de vacas e novilhas para a cria.
Segundo estimativas do Cepea e Asbia, entre 2019 e 2020 a quantidade de matrizes de corte aumentou 2,6%, seguida por um acréscimo de 1,0% em 2021 e de 0,2% em 2022. Com isso, a oferta de bezerros desmamados em 2023 será relacionada a um efetivo de matrizes que cresceu 1,0% (efetivo de 2021, com bezerros nascidos em 2022 e desmamados este ano). Para 2024, a oferta será oriunda de uma base de matrizes que cresceu 0,2%. Segundo esse indicador, estamos próximos de um platô de oferta de reposição.
Outra análise pode ser feita olhando os preços históricos. A figura 2 mostra a evolução dos preços do bezerro, deflacionados pelo IGP-DI.
A cotação parcial do bezerro em São Paulo (CEPEA) em março de 2023 já cedeu 33,6% (sombra no gráfico), em relação à máxima, em abril de 2021, de R$3,5 mil por cabeça, em valores deflacionados (R$3,1 mil à época).
Voltando a outro momento semelhante no gráfico, em março de 2019 o mercado estava 28,1% abaixo do pico anterior, quando começou a reagir, renovando máximas 12 meses depois, em março de 2020. O mercado não é feito de históricos, mas esses movimentos não deixam de ser uma referência a ser acompanhada.
Considerações
O momento de desinvestimento na atividade, com maior abate de fêmeas, é o alicerce das altas que virão nos próximos anos. Não há bola de cristal para definir o ponto exato de virada do ciclo, mas há chance interessante de que as arrobas baratas de bezerro compradas atualmente sejam vendidas com uma boa valorização ao longo do seu período na fazenda.
Se o ciclo na fazenda é mais curto, obviamente a estratégia não é atrasar a engorda, com um custo de capital de dois dígitos (juros). Nesse caso é ir aproveitando a troca interessante e girando a produção.
Já quem trabalha com um ciclo mais longo (bezerro a boi gordo), muito provavelmente está fazendo compras de arrobas que terão boas valorizações até a venda.
Lembrando também que esses bezerros baratos de hoje são os provenientes da estação de 2021, quando houve a maior participação de fêmeas inseminadas na história.
Além de preços interessantes de compra, a qualidade genética média da safra atual é a melhor (% de fêmeas inseminadas), uma vez que, salvo exceções, a genética da inseminação é superior. Possivelmente são bezerros que não estão recebendo o melhor tratamento nutricional (pelo momento de preços), mas com genética boa.
Aí a relevância de se fazer caixa na alta para aproveitar essas fases ruins de preços, que também são oportunidades de compra.
Você gostou desta coluna? Tem alguma sugestão ou informação nova? Por favor, me escreva no e-mail hyberville@hnagro.com.br.