Conteúdo Original | Revista DBO

Tendências na genética e o comércio de touros

Por Fernando Furtado Velloso – Veterinário, produtor rural, mestre em Produção Animal, sócio da Assessoria Agrop. FFVelloso & Dimas Rocha e da CRIO Central Genética Bovina.

Os avanços e tendências na genética de bovinos mostram quanta tecnologia está sendo incorporada em um touro melhorador. O comércio de reprodutores sinaliza um desencontro entre esse produto moderno e uma grande parcela dos animais que vão cobrir vacas no campo. Em recente notícia sobre tendências em genética na Austrália, no site Beef Central, li os termos: sustentabilidade, neutralidade de carbono, eficiência alimentar, reprodução de precisão, sistemas de acasalamentos dirigidos (PADs), progresso genético por TE e FIV e inteligência artificial na seleção de animais (IA).

O texto fala sobre o que começou a chamar atenção lá, em 2024, e que parece ser tendência de curto prazo na seleção dos touros. Não concordo e nem discordo. Ouço a palavra “carbono” e já me arrepio, mas acredito que a inteligência artificial vai nos atropelar sim. E para o bem. Vai empurrar o nosso carro pra frente.

Do outro lado do ringue desta luta tecnológica, vestindo roupão meio encardido e puído, está uma boa parte dos touros que vai para as fazendas. Ou pior, estão os bovinos machos que ficaram inteiros e são vendidos como reprodutores, com zero do pacote tecnológico disponível. Ilustres desconhecidos, pois muito pouco ou nada sabemos sobre a genética deles.

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No Brasil, entre a demanda teórica de touros e a quantidade de “registrados” produzidos tem uma distância imensa. Em números redondos: precisamos repor 300.000 anualmente e ofertamos cerca de 160.000 com registro genealógico, participantes de algum programa de melhoramento; ou seja, produtos cuja genética conhecemos um pouco. Estes números estão detalhados em artigo de Biluca e Chaker, publicado na DBO, em maio de 2021. São dados antigos? É o que temos pra hoje. E não deve ter mudado muito.

A reflexão que trago não é nova. Na pecuária, temos gestão com sistemas modernos, bastões eletrônicos para leitura de brincos, balanças inteligentes, quadriciclos e, em breve, pesagem por meio de câmaras 3D, dentre outras coisinhas. Do outro lado do ringue, anotações em cadernetas, livro caixa à mão, pilhas de notinhas fiscais ou até a falta destes controles. Não é diferente na reprodução e na genética. Estamos fazendo pregação de DEP, CEIP, eficiência alimentar, ultrassom de carcaça e outras ferramentas para convertidos. O nosso potencial cliente nem frequenta a igreja.

IATF e concorrência

Um produtor que auxilio na compra de touros, aqui no Sul, me falou: “Velloso, eu agora compreendi a IATF. É muito mais do que emprenhar as vacas. É uma revolução no sistema produtivo. Tem a ver com intervalo entre partos, concentração de parição, idade do bezerro, peso ao desmame. É uma técnica pra aumentar a produção e o faturamento da fazenda”.

Ele é um homem inteligente (acima da média) e estava entusiasmado com a sua descoberta, porque já fazia IATF, mas pensava a técnica de forma mais restrita. Na venda de touros, temos de dar uma parada e pensar também de forma mais ampla. Brigamos pelo cliente que está dentro do nosso círculo e pouco agimos no universo dos que estão fora. Tarefa para as associações de raça, programas de melhoramento, leiloeiras, corretores de gado e talvez mais gente que goste de comércio. A revolução da IATF no Brasil foi feita por soldados que gostam de comércio e negócios. Não foi por colegas focados em metrites, cistos, infusões uterinas e outros temas da clínica médica.

No RS, são vendidos cerca de 10.000 touros/ano. A demanda teórica de reposição é de 20.000 a 25.000. Logo, o universo de fora é bem maior do que o de dentro. A fonte sou eu mesmo. A estimativa é bem simples e deve estar subestimada, considerando-se o número de matrizes acima de 24 meses, o uso de 4% de touros e uma renovação anual de 15%. Descontam-se os 30% de vacas inseminadas, noves fora, e chegamos em mais de 20.000 touros necessários. O dobro do que vendemos.

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Ouço muitos produtores de touros queixosos com entrantes no negócio, novos criadores e novos leilões. Bastante gente apertada no limite de carga do elevador, a buscar espaço abrindo cotovelos. Mas, no mesmo prédio, alguns elevadores estão vazios. Não há tanta gente vendendo touros ou touros demais sendo ofertados. O mercado não está saturado como se repete tanto. Temos pouca gente comprando.

O desafio de quem trabalha com reprodutores (e faço parte) é pensar e agir para entrar no elevador que está vazio, parado e quietinho. Se a IATF pode acelerar uma fazenda, a falta de bons touros no campo desacelera a nossa pecuária. Temos um carro econômico para rodar bem a 100 km por hora. Estamos com giro alto a 60 km/h, e em terceira marcha. Desembreia e vamos trocar de marcha!

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