1º trimestre de 2024 é marcado pela intensificação das quedas nos preços do boi gordo
Por Denis Cardoso
O comportamento histórico dos preços do boi gordo durante o segundo trimestre de cada ano costuma jogar contra o pecuarista, alertam os analistas da Agrifatto. “A maior probabilidade é de que as cotações da arroba recuem nos meses de maio e junho”, antecipa a consultoria, que associa tal previsão ao típico movimento de desova da safra de “boiadas de capim”, quando as condições das pastagens pioram com a chegada dos meses mais frios, reduzindo a chance de retenção estratégica dos animais gordos nas fazendas.
Porém, a queda acentuada da arroba registrada no acumulado do primeiro trimestre deste ano levanta uma dúvida entre os analistas da Agrifatto: “Será que os preços do boi gordo já atingiram o fundo do poço e, daqui pra frente (até o final de 2024), não há espaço para grandes pioras?”, indagam eles.
Desde o encerramento de 2023, o preço médio da arroba do boi gordo no Estado de São Paulo, representado pelo Indicador Cepea/B3, sofreu recuo de quase R$ 25/@, saindo de R$ 252,30 (em 28/12/2023), para R$ 228,05 (em 1/4/2024), de acordo com dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, de Piracicaba (SP). Segundo apurou a Agrifatto, avaliando o desempenho dos preços do boi gordo nos primeiros trimestres dos últimos 16 anos, 2024 apresentou o pior desempenho para este período desde 2009, acumulando uma queda mensal de 8% no valor da arroba.
Março foi menos instável
No entanto, isoladamente, março de 2023 já não foi um mês de fortes baixas na cotação média da arroba paulista: houve desvalorização mensal de R$ 3,10/@, fechando o período em R$ 232,30/@, ante a retração de R$ 10/@ observada em fevereiro de 2024 (ante janeiro de 2024). Na avaliação dos analistas, particularmente em março de 2024, as chuvas bem distribuídas registradas nas principais regiões pecuárias brasileiras elevaram a capacidade de retenção dos animais nas pastagens naturais, o que fortaleceu o poder de negociação dos pecuaristas, contribuindo, assim, para uma maior estabilidade dos preços da arroba ao longo do último mês.
No final de março, o mercado futuro do boi gordo também sinalizava uma maior firmeza nos meses seguintes de 2024, ante o panorama visto na B3 no fechamento de fevereiro. Em 28 de março de 2024, a tela da B3 apontava um valor de R$ 227,45/@ para o contrato de maio e de R$ 228,45/@ para o papel de junho, acima dos preços de R$ 223/@ e R$ 222,70/@ indicados para os mesmos vencimentos no final de fevereiro (veja tabela acima). “Essa recuperação da arroba no mercado futuro reforça o sentimento de fim das quedas no mercado físico do boi gordo”, observaram os analistas da Agrifatto, em boletim divulgado no começo deste mês.
Momento de cautela
No entanto, reforçam os consultores, é preciso ficar atento ao comportamento do mercado ao longo das próximas semanas de abril e meses imediatamente posteriores, sem que seja descartada a hipótese de novas baixas acentuadas na arroba. “O momento é de cautela”, ressaltam os analistas, que recomendam aos pecuaristas o uso de mecanismos de proteção de preços (hedge) na B3. “Sugerimos o travamento de preços de venda de pelo menos 50% da previsão de abate dos próximos três meses”, propõe a Agrifatto, acrescentando que tais operações são fundamentais para a redução do “risco de exposição ao período mais crítico para a precificação do boi gordo no Brasil”.
Além da pressão negativa sobre os preços do boi gordo, a onda de baixa acometeu outros segmentos da cadeia da carne bovina ao longo de março, se estendendo também para o frango resfriado (encerrando uma trajetória ascendente computada desde junho/23). Em comparação ao mesmo mês do ano passado, a cotação média do boi gordo foi 17,4% menor em março/24, em São Paulo, enquanto a carcaça bovina no atacado paulista teve redução de 13,8% e a carne vermelha no varejo sofreu recuo de 4,2%.
No comparativo com fevereiro, a carcaça bovina registrou desvalorização de 1,84% em março, ficando cotada a R$ 15,86/kg em São Paulo – o pior preço dos últimos quatro meses, de acordo com cálculos da Agrifatto. “A principal justificativa para esse desempenho ainda é o excesso de produção de carne que chega aos atacadistas”, afirmam os analistas, referindo-se aos estoques elevados da proteína, um reflexo direto dos atuais abates excessivos de animais, tanto de machos quanto de fêmeas.
Considerando-se os cortes bovinos, o principal responsável pela queda das cotações da carne foi o traseiro, que apresentou recuo de 4,28% no último mês, sendo cotado a R$ 18,26/kg – o valor mais baixo dos últimos seis meses. Segundo a Agrifatto, o que impediu uma baixa maior da carcaça bovina foi o dianteiro, que valorizou 2,58% em março (preço médio de R$ 13,70/kg), impulsionado pela maior demanda tanto interna quanto externa.
Por sua vez, o frango resfriado não conseguiu mais sustentar o movimento de valorização dos últimos meses, recuando 1,43% em comparação com fevereiro, ficando cotado a R$ 7,12/kg, em média. A Agrifatto chama a atenção para a atual relação de troca entre a carcaça bovina e o frango resfriado, que atingiu o menor nível dos últimos 58 meses, com um quilograma de carcaça bovina adquirindo 2,23 kg de frango, patamar 7,3% abaixo da média histórica.
“Tal comportamento reforça o momento bem competitivo da carcaça bovina sobre as outras proteínas animais do mercado”, destacam os analistas. Além disso, mesmo com as quedas recentes nos preços da carcaça bovina, os frigoríficos brasileiros ainda mantêm margens positivas de comercialização, já que a matéria-prima (boiada gorda) tem registrado recuos mais expressivos nas cotações. Em março/24, o “spread” (diferença) entre a carne vendida pelos frigoríficos paulistas e o boi gordo fechou positivo em 2,17%, o maior nível desde outubro/23, “demonstrando que a indústria continua em uma situação confortável”, destaca a consultoria paulista.
Abates recordes nos frigoríficos de Mato Grosso
Seguindo o ritmo dos dois primeiros meses de 2024, o abate de bovinos no Mato Grosso atingiu, em março último, um novo recorde histórico para o mês, perfazendo 574.600 cabeças, volume 0,85% menor do que o registrado em fevereiro de 2024, mas 21,6% acima do observado em março de 2023, informou o Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea). “Tal resultado reforça um mercado muito bem ofertado”, afirma a Agrifatto, que acompanha de perto o comportamento do setor no Mato Grosso, Estado com o maior rebanho bovino do País e uma das principais referências para as demais praças pecuárias.
Comparado ao mesmo período de 2023, os frigoríficos mato-grossenses abateram em torno de 8.000 bovinos a mais por dia ao longo do mês passado. O total de machos chegou a 256.930 cabeças em março/24, 18,3% acima do resultado de março/23, enquanto o abate de fêmeas atingiu 317.680 cabeças, uma elevação de 24,4%, considerando-se a mesma base de comparação. Com isso, a participação das fêmeas sobre o total abatido no último mês subiu para 55,29%, o maior nível desde 2013, compara a Agrifatto.
No acumulado do primeiro trimestre de 2024, Mato Grosso abateu 1,77 milhão de cabeças, 30,1% superior ao volume de mesmo período de 2023. Foi o maior resultado da história, superando em 26% o recorde anual computado em 2013. As fêmeas foram as propulsoras do crescimento no período trimestral, com 95.150 cabeças abatidas no período, um aumento de 44,5% sobre igual período de 2023. Os machos chegaram a 818.110 cabeças, 17,90% acima do resultado obtido no primeiro trimestre de 2023.
A intensificação na oferta de fêmeas nas indústrias do Mato Grosso tem contribuído para um maior distanciamento entre os preços da arroba do boi gordo e da vaca gorda. Em março/24, essa diferença ficou em -10,18%, um avanço de 4,47 pontos percentuais em relação ao índice médio dos últimos 10 anos, de acordo com levantamento do Imea. No acumulado de janeiro a março deste ano, a diferença entre as duas categorias foi de -9,40%, um aumento de 1,66 ponto percentual sobre igual período de 2023 (-7,74%) e acréscimo de 5,13 pontos percentuais em relação ao resultado obtido no primeiro trimestre de 2022 (-4,27%).