Nova tecnologia contra a mosca-dos-estábulos

“Mapas de calor” monitoram a flutuação populacional do inseto, indicando quando e onde devem ser tomadas ações preventivas para evitar surtos.

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“Mapas de calor” monitoram a flutuação populacional do inseto, indicando quando e onde devem ser tomadas ações preventivas para evitar surtos.

Por Renato Villela

Os surtos recentes de mosca-dos-estábulos (Stomoxys calcitrans) em diferentes regiões do País, cujas imagens viralizaram em grupos de WhatsApp, têm tirado o sossego dos animais e o sono dos produtores. Quando isso acontece há pouco a ser feito, seja pela dificuldade de combater o grande número de insetos no ambiente, seja pela baixa eficácia do controle químico nos animais. Novas tecnologias, contudo, estão ajudando a monitorar a praga, o que possibilita tomar ações preventivas para evitar sua explosão populacional e minimizar prejuízos causados.

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Como mostrou reportagem de DBO em junho de 2009, quando surgiram os primeiros relatos de surtos nas fazendas, o problema está relacionado ao acúmulo de matérias orgânicas (cama de frango, resíduos de cana, palha de café, frutas etc), que, uma vez expostas e em decomposição, servem de “criatório” para a mosca.

O problema não é exclusivo do Brasil. Segundo Paulo Henrique Duarte Cançado, pesquisador da Embrapa Gado de Corte, na Austrália, por exemplo, existem mais de 30 substratos vegetais identificados como criatórios da mosca. “Lá o problema maior são os resíduos de hortaliças”, informa. De acordo com o pesquisador, qualquer cultura que gere resíduo em seu processo de industrialização pode se tornar um local de reprodução em potencial para a praga, se não for tratado e ficar a céu aberto. “Na Costa Rica, a mosca está associada à cultura do abacaxi; na Colômbia, à produção de óleo de dendê”, complementa.

Por aqui, as maiores ocorrências estão associadas aos resíduos da moagem da cana, principalmente a vinhaça. Quando lançado sobre a palhada deixada no solo pós-colheita, esse subproduto cria um ambiente favorável à postura de ovos. Como as áreas são grandes, a proliferação do inseto é exponencial.

Hematófaga, a mosca-dos-estábulos precisa migrar para as fazendas em busca de alimento, razão pela qual a origem das reclamações costuma estar nas propriedades ao redor das usinas canavieiras, onde se dá essa migração.

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“Em locais com usinas, mas sem atividade pecuária próxima, não se registram surtos. Onde tem pecuária sem usinas por perto, também não. Quando os dois setores produtivos estão próximos, temos registrado surtos com maior frequência e intensidade”, afirma a bióloga Taciany Ferreira, proprietária e responsável técnica da Volare Consultoria Ambiental, empresa sul-mato-grossense especializada no monitoramento, prevenção e controle da praga.

Taciany Ferreira, da Volare Consultoria Ambiental

SAIBA MAIS | Como combater a mosca-dos-estábulos; vídeo

“Mapas de calor”

A Embrapa Gado de Corte tem preconizado o acompanhamento da flutuação populacional como a melhor forma de combater a mosca. “É a estratégia mais eficiente que temos, tanto para prevenir quanto para tomar ações corretivas em casos de surto”, afirma Cançado. Para realizar esse monitoramento, Taciany criou um modelo baseado em “mapas de calor”.

Funciona da seguinte forma: nas usinas e nas propriedades do entorno, são colocadas, em pontos estratégicos, algumas “armadilhas reflexivas”, cuja função é estimar a evolução da população de moscas. Em formato cilíndrico, feita em fibra de vidro transparente, essas armadilhas refletem a luz solar em um comprimento de onda atrativo para elas. Sua superfície é recoberta por uma película de plástico contendo cola entomológica específica para capturá-las.

Armadilha com cola para monitoramento da mosca.

Uma vez por semana, a equipe da usina recolhe as armadilhas e encaminha para a equipe de Taciany, que faz a contagem das moscas. Há um critério de avaliação, de acordo com o número encontrado, para estimar sua população, estabelecendo quatro níveis de infestação: baixo, alerta, alto e crítico. A partir daí, um software gera um mapa de calor numa escala de cores correspondente (verde, amarelo, laranja e vermelho). “Essa ferramenta tem feito toda a diferença no nosso trabalho, porque nos mostra, visualmente, onde podem estar ocorrendo falhas de manejo dos resíduos orgânicos, seja nas usinas ou nas propriedades rurais”, diz.

Além do mapa de calor, Taciany utiliza drones para diagnóstico de como está sendo feita a aplicação de vinhaça no campo. “Avaliamos a qualidade dessa operação nas áreas de cana”, afirma. Um erro comum, por exemplo, é quando o volume aplicado excede determinado limite, estabelecido de acordo com o tipo de solo e a forma de aplicação, fazendo com que a vinhaça demore a infiltrar e fique “empoçada” na superfície do solo, criando um ambiente propício à proliferação da mosca. “Cruzamos essa informação com o mapa de calor e, muitas vezes, descobrimos que o aumento da mosca está relacionado a falhas como essa. É um trabalho de inteligência”, afirma.

Ações preventivas

Detectada uma situação de “alerta”, a usina é informada sobre eventuais erros no manejo. A partir daí a equipe é acionada e são tomadas uma série de medidas. “Cada usina demanda um plano de ação específico, em função do tipo de manejo e da estrutura”, diz. Uma das ações preventivas mais usadas tem sido a aplicação de larvicidas sobre os criatórios. “É um tratamento preventivo que tem funcionado muito bem”, afirma. O pesquisador Paulo Cançado reforça a importância do monitoramento para o sucesso da prática. “É inviável aplicar o larvicida em toda a área de cultura, por isso a identificação do foco é fundamental”.

Outra medida de caráter preventivo que tem sido preconizada é o uso de armadilhas para redução populacional. Elas podem ser colocadas tanto na usina quanto nas propriedades próximas. O objetivo é prevenir os surtos. Dentre as opções está a bandeira quadrangular (1 m x 1 m ) bicolor, metade azul, metade preta (cores que mais atraem os insetos, segundo pesquisas). Confeccionada em tecido de algodão, é impregnada com inseticida contendo um atrativo sexual, que a mosca suga e logo morre. Também há a opção de se usar uma bandeira de filme plástico, impregnada com cola entomológica de cor azul. A distância entre as bandeiras é de 20 m e o total a ser colocado depende do grau de infestação. (veja sequência de boas práticas para se prevenir da mosca no quadro abaixo)

Boas práticas ajudam a prevenir surtos

  • Limpe, semanalmente, as instalações (cochos, mangueiros, currais) e remova dejetos animais e restos alimentares.
  • Maneje adequadamente os resíduos orgânicos: empilhe e cubra-os com lona (30-40 dias), até cessar a fermentação.
  • Mantenha a silagem totalmente coberta com lona plástica, evitando a exposição do material.
  • Controle as moscas com armadilhas (bandeiras azul e preta com inseticida ou cola entomológica).
  • Instale-as no entorno dos currais e piquetes próximos, com distância de 20 metros entre si, de preferência pela manhã ou ao entardecer.
Fonte: Embrapa e Volare Consultoria Ambiental. Adaptação: DBO.

Praga se adapta

Nos últimos anos, as usinas canavieiras investiram em novas tecnologias, promovendo mudanças nos tratos culturais que têm contribuído para a diminuição dos ambientes propícios à reprodução da mosca-dos-estábulos. Uma delas é a aplicação de vinhaça na linha da cana, via caminhão, o que reduz a quantidade distribuída por área, evitando o empoçamento. A própria Embrapa emitiu uma Circular Técnica com orientações sobre o manejo adequado da torta de filtro, limpeza dos canais e tanques de vinhaça para remoção da “borra de vinhaça”, além da escarificação do solo, que promove o enterro parcial da palhada e favorece a infiltração da vinhaça recém-aplicada na cultura.

O que se vê no campo, no entanto, é que a praga tem se adaptado a algumas dessas mudanças de manejo. “Mesmo na vinhaça aplicada em linha, a mosca tem conseguido se reproduzir”, conta Taciany. O mais surpreendente, no entanto, é que a bióloga tem flagrado focos de proliferação em cana alta irrigada e até mesmo nas folhas mortas de pastagem recém-reformadas durante o período chuvoso.

“À medida que as usinas modificavam seu manejo, nossa expectativa era de que os surtos diminuíssem. Infelizmente, não é o que estamos observando. Acredito que, em anos mais chuvosos como tem sido 2022, teremos grandes desafios pela frente”, salienta.

Leia a Revista DBO de dezembro AQUI.

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