Contrapondo a alta taxa de desemprego registrada no Brasil (7,8%), a carência de mão de obra qualificada, em diversos setores econômicos, também é igualmente alarmante e reflete um grande problema estrutural do país: a falta de boa educação. Empresários sob as leis trabalhistas não mais suportam tamanha rotatividade nos postos de trabalho.
Na bovinocultura de corte não é diferente. Pesquisa da ManpowerGroup Brasil de 2022 revelou que a falta de mão de obra qualificada na atividade gira em torno de 81%, percentual muito próximo do número de pessoas que optaram por fixar moradia nos centros urbanos, que é de 84%. Certo é que, atualmente, sempre há uma vaga em aberto na fazenda.
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Outra contradição é que, curiosamente, quem está no campo melhorou seu nível de escolaridade. Há 50 anos, o número de analfabetos girava em torno de 26%. Hoje, ele não chega a 3%. Logo, até pela própria evolução dos meios de comunicação e acesso à Internet, todos sabem o que são boas condições de trabalho.
Um olhar para quem cuida da lida – Quem acompanha de perto essa dura realidade é Jaqueline Lubaski, pedagoga, jornalista e consultora de gestão de pessoas no agronegócio pela Destrave Desenvolvimento. Para ela, a conjuntura do campo é “desesperante”, em especial nas propriedades de pecuária. “Não temos mais vaqueiros”, ressalta.
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E o problema se agrava na medida em que as empresas rurais são mais produtivas e apresentam maior nível de tecnificação. A principal estratégia da Agrojem, empresa de pecuária verticalizada – confinamento com capacidade para 70 mil cabeças com propriedades no Tocantins, é a Integração Lavoura Pecuária (ILP).
Tem atualmente 500 funcionários distribuídos na agricultura (34 mil hectares de cultivo entre 1a e 2a safras) e na operação de pecuária, com duas unidades de confinamento. “A boa condução da ILP é um enorme desafio por si só. Contudo, a terminação intensiva, não só para o uso inteligente da terra como também das máquinas e estruturas disponíveis ampliam as dificuldades”.
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É o que salienta Pablo Pusterla, diretor administrativo e de recursos humanos da Agrojem. Ele explica que a rotatividade do setor ainda é muito alta. Porém, observa que, conforme as ações de desenvolvimento se consolidam, também aumenta a longevidade dos colaboradores na empresa. “Assim melhoramos em todos os setores, principalmente de segurança e operação do confinamento”.
As ações da Agrojem vão ao encontro das ações que Lubaski defende como necessárias para minimizar os problemas de mão de obra no campo. Elas pedem que cada produtor responda uma pergunta simples: “Será que eu trabalharia nas condições que a minha empresa (empresário ou gestor) oferecem?”.
Colaboradores mais conscientes e satisfeitos – A necessidade de investir nas condições de trabalho e capacitação, dentro da fazenda, também se tornou prioritária para Antônio Carlos Rezende, do Grupo Rezende, com propriedades no Mato Grosso, um dos Estados mais afetados pela carência de mão de obra qualificada, até de nível superior. “As pessoas têm menos vontade trabalhar em fazenda”, diz.
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Ele é outro criador que possui pecuária verticalizada, inclusive com forte produção de touros Nelore CEIP e PO (1 mil/ano). São duas fazendas no Pantanal (Santo Antônio do Leverger, MT) com 17 mil matrizes em cria e outras duas (região de Juscimeira, MT) em recria, engorda e preparação de touros para venda, ambas com Integração Lavoura Pecuária (ILP).
E esse cenário de evasão de mão de obra, até pelo êxodo rural que ainda é realidade, só tem como alternativa o investimento nas pessoas, conforme aponta a especialista Jaqueline Lubaski que, inclusive, defende tais “recursos como se fossem quaisquer outros na fazenda, visando incrementar a produtividade”.
Ana Nery Terra Souza, diretora Estratégica do Grupo Água Tirada, com pecuária também verticalizada e propriedades no Mato Grosso do Sul, adquiriu essa consciência já se vão bons anos. Ela é bastante crítica em relação a educação oferecida no Brasil. “Entendo que há um descompasso com as demandas”, justifica.
Ela fala de pessoas em vários níveis de formação “nada preparadas quanto a habilidades, conhecimento técnico, comportamental, liderança e gestão”, mas que vê caminhos para candidatos a profissionais “sem experiência”. Para tanto fechou parceria com a Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS).
“Recebemos muitos estagiários para que, cada vez mais, os novos tenham a possibilidade de lidar com as atividades operacionais e ganhar bagagem. Também recebemos alunos dos ensinos fundamental e médio para que possam desenvolver interesse pelo setor e, quem sabe, até vislumbrar carreira”, afirma.
Da capacitação ao complemento da educação básica – A diretora acredita na relevância de treinamentos, cursos e eventos técnicos para a capacitação dos colaboradores do Grupo, além de treinamentos comportamentais, voltados até para relacionamento familiar, e na parte de gestão, de modo que possam se desenvolver continuamente dentro de seus respectivos potenciais e ambições.
Outra ação realizada é uma parceria com a Fundação Shunji Nishimura que oferece escola com aulas remotas no contraturno para os filhos dos colaboradores lotados no Pantanal.
No bioma está a “maior concentração de dificuldades, com sistema educacional formal deficitário, sem qualquer ferramenta que desperte interesse pela lida nas fazendas, nem mesmo a sucessão nas propriedades”.
O Grupo Água Tirada ainda conta com o apoio de parceiros como Senar, empresas privadas de nutrição animal, sanidade, máquinas e implementos, entre outros. Além disso, como dito anteriormente, oferecemos treinamentos em gestão e desenvolvimento pessoal, cursos e apoio direto para relacionamento familiar.
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