Por Hyberville Neto – consultor e diretor da HN AGRO
Para avaliar a fase do ciclo pecuário em que estamos, podemos considerar as variações reais de preços, a participação de fêmeas nos abates, entre outros fatores.
Geralmente a participação de fêmeas anda junto com os preços, em uma correlação inversa, com momentos de menor participação de fêmeas no gancho relacionados a preços em alta, mas nem sempre a alteração de tendência ocorre de maneira simultânea.
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Com isso, não existe um mês específico no qual podemos “cravar que o ciclo virou”. Não faço essa ponderação para ficar em cima do muro quanto às expectativas, mas para ponderar que a virada ocorre de maneira um pouco turva. Muitas vezes, o ano de mudança de tendência é um ano de mudanças mais sutis nos preços em valores reais, ou seja, deflacionados.
É o que esperamos para 2024, um ano de preços médios para o boi gordo um pouco acima do observado em 2023, em valores reais. Para referência, a cotação média de 2023 foi R$254,20/@, tomando São Paulo como referência, valores do Cepea, deflacionados pelo IGP-DI.
Pela quantidade de variáveis de oferta e demanda (MI e ME) envolvidas, o ciclo não é algo matemático, mas algumas referências históricas são úteis, desde que consideradas com a devida cautela.
A mais usada é a participação de fêmeas nos abates. Utilizamos aqui a referência da participação de fêmeas nos abates nos doze meses imediatamente anteriores com dados do IBGE, para inspeções municipal, estadual e federal. Para o intervalo de setembro a dezembro de 2023, como tais dados não estão disponíveis, usamos a tendência da participação de fêmeas nos abates SIF (MAPA). A partir da oscilação desde grupo, estimamos a participação nos abates IBGE no último trimestre.
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A figura 1 traz essa evolução (abates de fêmeas nos doze meses anteriores) e a variação de preços em doze meses, para bezerro e boi gordo, considerando valores reais.
Usando a projeção para o último trimestre, como citada, temos uma participação estimada de 41,6% de fêmeas nos abates no acumulado de 2023. A participação de fêmeas é representada pelas barras verdes (série) e azuis (três meses projetados).
Perceba que o patamar é próximo dos momentos de maior participação dos últimos ciclos. Em 2019, a participação atingiu 41,7% nos doze meses terminados em janeiro/19. Em 2013 as fêmeas compuseram 42,8% nos doze meses terminados em julho/13. Em 2006 o valor máximo ocorreu em junho, com 43,9%
Ressalto que o ciclo não é algo pasteurizado, consequentemente, o histórico não é garantia que os parâmetros se repetirão, mas é uma referência interessante.
A própria desvalorização do boi e bezerro em doze meses também seguiu um certo padrão nas últimas fases de baixa. Seguindo essa lógica, pode ser que as quedas anuais (YoY) diminuam nos próximos meses (linhas subindo) até uma inversão para altas, nas comparações anuais.
Quando consideramos os vales de preços de agosto e setembro de 2023, considerar uma alta anual é muito plausível (pela base baixa), mas mesmo nos meses fora daquele período crítico, altas anuais seriam o cenário que mais se enquadraria na tendência da figura 1.
E nessa linha, o que seria uma alta frente a outubro de 2023? O preço médio foi de R$237,80/@ naquele mês, usando o indicador nominal como referência. Se projetarmos uma inflação de 4% (IGP-M, segundo o último Focus), para que o mercado trabalhe com altas anuais, estamos falando de valores acima de R$247,30/@.
Para comparação, o mercado futuro em 30/1 projeta algo em torno de R$250,00/@ para outubro, o que representaria valorização real na comparação de doze meses.
Considerações
A “chave do ciclo” deve virar em decorrência de preços mais firmes para a reposição. Na nossa visão, esse é o ponto fundamental que pode tirar fêmeas do gancho e dar um fôlego para os preços do boi gordo.
Por enquanto, a oferta de fêmeas segue relevante, mas aí temos o contexto de qualidade das pastagens afetadas pelo El Niño, que atrasou as chuvas e influencia a capacidade de manutenção dessa vacada, que ainda não voltou a ganhar destaque na fazenda, uma vez que o preço do bezerro segue patinando.
No segundo semestre, temos o cenário da relação de troca com o milho influenciando o volume de gado de sistemas mais intensivos. Ainda há muita coisa para acontecer no mercado do milho.
Em resumo, há diversos indicadores que sugerem que o mercado está perto de um momento mais positivo, uma virada de ciclo.
Você gostou desta coluna? Tem alguma sugestão ou informação nova? Por favor, me escreva no e-mail hyberville@hnagro.com.br.
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